Comprei o livro de Lydia Cacho, “Memórias de uma infâmia”,
por acaso. Dei uma olhada na contracapa e a história de uma jornalista em sua
luta contra a pedofilia e a pornografia infantil no México me interessou. Em
parte, porque acabara de ler “Spotlight – Segredos Revelados”, que me causou
náuseas e um incômodo muito grande sobre esse tipo de abuso contra crianças.
As histórias desses dois livros têm muitos pontos em comum. O principal deles
é a conivência e a cumplicidade de autoridades, que em ambos os casos
empreendem esforços para que os crimes sejam varridos para debaixo do tapete.
Outro aspecto comum às histórias são as tentativas de intimidação dos
jornalistas determinados a revelar os crimes.
Também em Spotlight, a equipe do Boston Globe é intimidada
em diversos momentos. É claro que no caso de Lygia Cacho, de forma muito mais
enfática e cruel. Ela foi seqüestrada, torturada e estuprada a mando de
políticos, empresários e policiais envolvidos na rede de pedofilia denunciada
em seu livro. Depois de libertada, foi vítima de um atentado.
Em sua trajetória, não faltaram figuras repugnantes que não
pouparam esforços para difamá-la e proteger uma poderosa rede de pedofilia e
pornografia infantil que, a partir de Cancun, no México, se estendia para
outros países do mundo. O poder deles era (possivelmente ainda é) tão grande
que contava com a cumplicidade de um governador e de representantes da justiça
mexicana.
Apesar de todas as dificuldades e da infâmia que enfrentou,
Lydia Cacho manteve-se firme e não desistiu. De acordo com ela, sua luta é
pelas meninas e pelos meninos abusados. Surpreendentemente, ela conseguiu
manter-se otimista em meio a tanta podridão, como escreveu em seu diário após
uma das inúmeras averiguações psicológicas às quais precisou se submeter:
“Depois que meus olhos viram tanta miséria humana, examino
meu coração - como se fosse uma cesta de maçãs vermelhas – em busca da
esperança fresca e doce. Eu a conheço. Mesmo que me persigam lá fora, aqui, em
minha alma, há paz, paz que se nutre de minha persistência, de minha
determinação. A verdade é perdurável, o medo é perecível. Minha fortaleza e meu
poder repousam em aceitar a realidade e revelá-la tal como é.”
O caso das violações dos direitos humanos da autora teria
ficado por isso mesmo, se não fosse o envolvimento de artistas, jornalistas e
intelectuais de todo o mundo, que enviaram às autoridades mexicanas um
abaixo-assinado solicitando providências. Entre os signatários estava o
cineasta Inarritu, diretor do filme “O Regresso”, que concorreu ao Oscar 2016.
No entanto, a leitura desse livro me fez lembrar de
outro filme, que conta a história de outros dois jornalistas, empenhados em
denunciar a violência sistemática contra mulheres em Juarez, na fronteira do México com os Estados Unidos. Com
participação de Jeniffer Lopez e Antonio Banderas, “Cidade do silêncio” é
baseado em fatos reais que corroboram as dificuldades em enfrentar crimes no
país que tenham como cúmplices os poderes político e econômico.
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